A relação entre ciência, tecnologia e alimentação é antiga. Sem essa integração, muitos alimentos hoje ofertados no mercado não poderiam ser produzidos. Além disso, o food science promove a união dos conceitos para proporcionar segurança aos alimentos, evitando a contaminação e deterioração dos mesmos, e melhor armazenamento e transporte.
A tecnologia de alimentos é fundamental, pois garante produtos seguros e saudáveis. E cada dia mais, a demanda por produtos benéficos à saúde e funcionais aumenta. Afinal, a população está de olho nos rótulos, com o objetivo de evitar alimentos nocivos e prejudiciais à saúde.
Para entender como aconteceu a evolução dos alimentos e dos processos de fabricação, veja a linha do tempo que parte da pré-história até os dias de hoje. Ao final tem um infográfico completo sobre o panorama do Food Science, confira.
- Pré-história: uso do calor para cozinhar e secagem dos alimentos com métodos naturais;
- Idade antiga: surgimento de novas técnicas para o preparo e armazenamento dos insumos, como a salga, defumação e cura;
- Século XVIII: aprimoração do conceito de pickiling e surgimento da apertização;
- Século XIX: aceleração do congelamento e refrigeração de alimentos; início das instalações fabris no Brasil e da fabricação do leite condensado;
- Séculos XX e XXI: uso de ozônio e de ultravioleta e o recravamento de latas; fabricação em larga escala de concentrados, congelados e desidratados; invenção da embalagem a vácuo; surgimento de processos como ultrassom e infravermelho, pasteurização, engarrafamento asséptico, dentre outros; começo da comercialização de congelados e criação das embalagens assépticas.
1. Pré-história
A história da tecnologia alimentar e do food science em si remonta à pré-história. Durante o período, os humanos possuíam pouquíssimas alternativas para preparar e conservar alimentos.
Dentre as emergências dos povos que viveram até 4000 a.C., destacam-se a utilização de calor para cozinhar, secagem dos alimentos com recursos da natureza e fermentação.
Nossos ancestrais tinham um cardápio com poucas opções, variando entre carne de caça, peixes, frutos e raízes. Pelo fato de serem nômades, eles aproveitavam o que era encontrado pelo caminho.
2. Idade Antiga
Marcada pela queda do Império Romano, a Idade Antiga é o período que parte de 4000 a.C. até o século V. E também é lembrada por epidemias, invernos rigorosos e guerras, fatores que contribuíram para a elaboração de novas técnicas de preparo e armazenamento dos alimentos.
A criação do bacon, por exemplo, ocorreu na Idade Antiga, devido ao aprimoramento de salga, defumação e cura. A preservação da carne foi melhorada em decorrência do uso da mistura de sal com nitrato.
3. Século XVIII
Antes de mais nada, vale citar que entre a Idade Média e a Idade Moderna não foram registrados avanços relevantes. Portanto, a linha do tempo segue com a Idade Contemporânea.
Estudos de Lavoisier relacionados a nutrição, química e fisiologia contribuíram positivamente para o avanço de tecnologias de alimentos. O conceito de pickling, que existe desde a Idade Antiga, foi aprimorado no fim dos anos de 1790.
Durante a Revolução Industrial, que iniciou na segunda metade do século XVII, o desenvolvimento da produção de alimentos processados se intensificou.
Por exemplo: a conservação dos alimentos pelo calor, também conhecida por apertização, método no qual são usados latas ou vidros para o acondicionamento dos alimentos, foi criada neste período, uma grande evolução para a comercialização de comidas.
4. Século XIX
A evolução da microbiologia, fisiologia e química proporcionou a consolidação da toxicologia como parte da ciência moderna. Assim, o desenvolvimento de congelamento e refrigeração foi acelerado, aumentando as possibilidades de armazenamento de alimentos.
Vale ressaltar que o fato do cientista Louis Pasteur ter demonstrado a atuação de microrganismos, em 1859, em contato com bebidas alcoólicas, influenciou positivamente o avanço tecnológico. Porém, a patente do processo de pasteurização aconteceu apenas em 1865.
Nos últimos anos do século XIX, dois importantes acontecimentos: o começo das instalações fabris no Brasil e a descoberta da contaminação de alimentos por conta da bactéria Salmonella, pelo bacteriologista August Gartner.
Uma curiosidade sobre o século XIX: em 1853 foi iniciada a fabricação de leite condensado, pelo fazendeiro Gail Borden Junior.
5. Século XX e começo do XXI
Muitos avanços ocorreram no século XIX, no entanto, foi no século XX que o campo da tecnologia de alimentos se desenvolveu como nunca antes registrado.
Um dos principais motivos foi a Segunda Guerra Mundial, travada entre 1939 e 1945. Por consequência da guerra, o preparo e consumo dos alimentos deveria ser simples e prático. Além disso, precisavam ser duráveis, seguros e fáceis de serem transportados.
Entre 1904 e 1939 aconteceram poucos avanços relevantes, como o uso de ozônio e de ultravioleta e o recravamento de latas. A partir daí, diversos processos avançaram vagarosamente.
A fabricação em larga escala de concentrados, congelados e desidratados foi iniciada em 1940. Três anos depois, aconteceu o lançamento da técnica de Atmosfera Controlada, para armazenar grãos e frutas.
Em 1947, a invenção da embalagem a vácuo contribuiu, e muito, para o armazenamento de alimentos. Posteriormente, foi a vez do aquecimento por micro-ondas e o congelamento por meio da criogenia.
Até o final dos anos 1960, mais processos surgiram, com destaque para o uso de ultrassom e infravermelho (1955), pasteurização UHT (1957), refrigeração com nitrogênio líquido (1960) e engarrafamento asséptico (1964).
Já entre 1970 e 1990, houve o início da comercialização de alimentos congelados para micro-ondas, a criação de embalagens assépticas e o uso do conceito de aquecimento ôhmico.
A década de 1990 ficou marcada pela esterilização por alta frequência, pasteurização por pulso elétrico, processo UHP ter se tornado comercial e a adoção da irradiação para esterilizar carne moída.
Por fim, na virada do século XX para o XXI, pode-se observar o processo UHP sendo aplicado comercialmente em sucos e a utilização de alta pressão em alimentos cárneos.
Processos científicos que contribuíram para a evolução dos alimentos
Em linhas gerais, tecnologias de food science elaboradas para a conservação têm o objetivo de eliminar ou deter microorganismos, garantir segurança e possibilitar o armazenamento correto.
Dentre as ações tecnológicas na conservação dos alimentos, deve-se destacar:
- adição de açúcar;
- adição de aditivos;
- cocção;
- concentração;
- cura ou maturação;
- congelamento;
- defumação;
- esterilização;
- fermentação;
- pulso elétrico;
- irradiação de raios gama e ultravioleta;
- salga;
- secagem;
- tratamento térmico.
Ou seja, servem não apenas para melhor conservar, como também para aumentar a segurança do que é consumido pelos humanos. Veja, a seguir, 5 importantes áreas pertencentes à food science.
Biotecnologia
Basicamente, a biotecnologia possibilita usar organismos vivos, ou células e moléculas, para a obtenção de produtos, bens e serviços. Ela ajuda na resolução de problemas enfrentados pela sociedade em geral. Na alimentação, promove avanços na produção agrícola e no aprimoramento de comidas e bebidas.
Para ilustrar melhor, sem a biotecnologia seria difícil produzir e comercializar alimentos presentes no dia a dia dos brasileiros, como pão, suco, queijo e iogurte. Afinal, todos estes alimentos, e vários outros, dependem do auxílio de organismos vivos.
A biotecnologia aplicada nos alimentos possibilitou a fabricação de leite sem vacas, clara de ovo sem galinha, carne sem gado e soja com 60% menos gorduras, por exemplo.
Química
Trata-se da ciência responsável por estudar os elementos que compõem os alimentos e as mudanças químicas em meio ao processamento e estocagem dos mesmos. Assim como para a análise de compostos adicionados de maneira acidental ou não.
A evolução da química dos alimentos sofreu avanços importantes após a Segunda Guerra Mundial. Como consequência, métodos mais assertivos, precisos e confiáveis foram disponibilizados.
Microbiologia
Na alimentação, a microbiologia tem o intuito de estudar o comportamento de microrganismos presentes nas comidas. O foco está nos que conseguem estragar ou deteriorar alimentos, algo prejudicial para a saúde.
Porém, também existem os microorganismos benéficos, adicionados na produção de uma série de alimentos, como queijos, cerveja, pão, vinho, salame e conservas.
Durante a história, marcos importantes foram alcançados, no sentido de como aconteciam as contaminações e as práticas para evitá-las.
- 1905: criação de um método padrão para que a água e o leite fossem analisados;
- 1962: elaboração da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) e Comissão Internacional de Especificações Microbiológicas dos Alimentos (ICMSF);
- 1969: Norma de Boas Práticas de Fabricação (BPF), um conjunto de procedimentos obrigatórios desenvolvidos para garantir um padrão mínimo de qualidade nos processos de fabricação;
- 1971: Disponibilização da ferramenta Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC), que consiste em um sistema de controle sobre a segurança do alimento mediante a avaliação e controle dos riscos biológicos, químicos e físicos em todas as etapas, desde a produção da matéria prima até a fabricação, distribuição e consumo.
- 2005: ISO 2000, norma internacional de segurança alimentar que engloba todas as etapas da produção, partindo da colheita até o consumo dos alimentos.
Nos dias atuais, existe a integração entre Boas Práticas de Fabricação (BPF) e os Procedimentos Operacionais Padrão de Higienização (POP), algo fundamental para evitar qualquer tipo de problema durante a produção dos alimentos. Vale ressaltar que essas práticas são obrigatórias.
Nanotecnologia
Tecnologia que trabalha com átomos e moléculas, e potencializou diversas áreas, incluindo a de alimentos. Ela pode ser inserida em todos os processos da cadeia produtiva: agricultura, processamento, embalagem e suplementos.
Portanto, traz apenas benefícios, como evitar que bactérias contaminem alimentos e a utilização de nanopartículas em embalagens inteligentes, que preservam o sabor e inibem atividades microbianas.
Toxicologia
Enquanto isso, a toxicologia tem a função de estudar e analisar o efeito de agentes químicos, podendo ser conservantes e flavorizantes, substâncias que fazem parte da produção, ou elementos contaminantes.
Em outras palavras, serve para mensurar a toxicidade de substâncias presentes nos alimentos, verificando os efeitos negativos na saúde de quem os consome.
Os agentes químicos estão presentes na comida, portanto, o principal papel da toxicologia é definir a utilização segura das substâncias. Tal qual entender o motivo dos danos e a dose ideal para reduzir prejuízos à saúde.
Engenharia de alimentos
A engenharia de alimentos abrange todos os processos ligados à industrialização dos alimentos. Desse modo, engloba processos desde a produção e estocagem, passando pelo armazenamento até a qualidade do que é comercializado.
Mais do que isso, a engenharia de alimentos pode também contribuir na formação de profissionais, na atuação interna das empresas, em projetos de pesquisa e na manutenção da saúde pública.
Nutrição
A nutrição serve para entender melhor os nutrientes e a ação dos alimentos no organismo. Esta área de conhecimento estrutura a alimentação servida em hospitais, escolas e empresas, por exemplo.
A nutrição prioriza a alimentação saudável, buscando suprir as demandas de nutrientes, minerais e vitaminas de cada um. Além de garantir o funcionamento adequado do organismo, serve como meio de prevenção de doenças, sendo diabetes, anemia e obesidade as principais.
Avanços na indústria alimentícia
Por causa da ação desempenhada pelas áreas citadas, uma série de avanços foram registrados na indústria alimentícia. Mais do que isso, sem a ciência, muitos produtos hoje disponíveis no mercado não existiriam.
Com isso, a indústria consegue evoluir de maneira constante, a cada dia surgem novas bebidas e alimentos. E os processos cada vez mais seguros, práticos e sustentáveis.
Dentre os principais avanços tecnológicos, 4 prometem influenciar e revolucionar a indústria alimentícia nos próximos anos.
Como é o caso das embalagens ativas, que atuam química e biologicamente no alimento, resultando no aumento da preservação da comida. Elas podem servir como agentes antimicrobianos ou até mesmo como uma espécie de barreira contra o oxigênio.
A microbiologia e a nanotecnologia permitiram a criação de alimentos com novas variedades de aditivos, propriedades e elementos funcionais, cada vez mais saudáveis e seguros. E também melhorou a experiência sensorial e o papel dos estabilizadores.
Já a Indústria 4.0 é a verdadeira revolução, chegou para alterar profundamente a produção, transporte, armazenamento e consumo, por meio da digitalização dos processos citados. Serve para reduzir perdas, aumentar os lucros e potencializar a produção.
As informações obtidas pelas indústrias ajudam a traçar o perfil dos consumidores, conhecendo seus gostos e preferências. Algo que aumenta as possibilidades de criação de produtos personalizados e garante novos jeitos de interação com os clientes.
O futuro da Food Science e seus principais desafios
Estamos vivendo uma nova era na indústria alimentícia. Como já mencionado, a integração do food science com a tecnologia aumentou as possibilidades do setor.
As mudanças nos principais fatores da produção já começaram, os avanços científicos somados à inovação instauraram uma nova fase na alimentação mundial. E nos próximos anos, muita coisa tende a avançar.
Se no passado o foco era atender apenas às demandas nutricionais e garantir um produto seguro e saudável, o futuro será pautado pelas demandas do planeta. Ou seja, produzir alimentos saudáveis e sustentáveis.
A ideia é criar um mercado moderno, eficiente, sustentável, saudável e inteligente, alterando todos os processos, desde a colheita até a mesa do cliente.
Em paralelo, a indústria deve lidar com a limitação de recursos e aumento expressivo da população, precisando se reinventar para atender a demanda. Mais do que nunca, a ciência e tecnologia serão vitais, pois a estimativa da FAO é de aumento em 70% na produção mundial de alimentos até o ano de 2050.
A única maneira de evitar a falta de alimentos no futuro é por meio da inovação. Nas próximas décadas, frutas e legumes poderão ser cultivados em qualquer parte do planeta, independente das condições climáticas do local.
O uso de impressoras 3D será cada vez mais constante, ampliando a oferta de alimentos para quem mais precisa. Proteínas vegetais e carnes sintéticas mais presentes nas gôndolas e prateleiras.
A adoção de bioenergia e biomateriais nos processos de fabricação dos alimentos, como forma de reduzir os impactos no meio ambiente. Mercados e restaurantes automatizados, incluindo a presença de cozinheiros e garçons robotizados.
Serão inúmeras mudanças e inovações que irão revolucionar e mudar de vez a cadeia alimentar. A meta é garantir um futuro melhor, em sintonia com as necessidades das pessoas e as demandas do planeta.